FUMO É INIMIGO Nº1

Maria João Marques Gomes preside à Sociedade Portuguesa de Pneumologia e é directora deste mesmo serviço no Hospital Pulido Valente, em Lisboa.
Correio da Manhã – Uma das conclusões que salta à vista no Livro Branco é o aumento relativo das doenças respiratórias no futuro próximo. A que se deve esse aumento?
Maria João Gomes – O aumento das doenças respiratórias deve-se a duas ordens de razões. Por um lado, os avanços na medicina levam a que as pessoas morram menos de outras doenças, acabando por sucumbir às doenças respiratórias no final da vida. E também entre as crianças também muitas hoje morrem por doenças respiratórias quando antes nem sequer sobreviviam à nascença, como os prematuros.
– Não parece paradoxal que os avanços na medicina se traduzam num aumento relativo das doenças respiratórias?
– Segundo a Organização Mundial de Saúde, a bronquite crónica é actualmente a sexta causa de morte. Em 2020 será a terceira. Por outro lado, a mudança nos hábitos de vida como o tabagismo (cujos efeitos só a prazo se fazem sentir), o sedentarismo e a poluição. Também falo nestes aspectos, mas o tabaco é de longe o mais grave.
– Mais uma vez, nas doenças de foro respiratório como no coração, o tabaco aparece como inimigo público n.º 1. Se o tabaco fosse eliminado, acabavam as doenças?
– Se acabasse o consumo de tabaco diminuíam consideravelmente as doenças respiratórias. Há doenças que se podem quase considerar como provocadas pelo tabaco, como o cancro do pulmão ou da laringe (90 por cento dos casos são de fumadores). Por outro lado, há doenças que não sendo provocadas pelo fumo são por este agravadas, dificultando o respectivo tratamento. Estão neste segundo caso, a asma, pneumonias e as próprias constipações. Um dos objectivos principais para a saúde pública é o combate ao tabagismo.
– Uma das formas é a prevenção e é visível a aposta feita nos mais diversos níveis, mas como pretende convencer alguém que fuma e se sente bem a deixar de o fazer?
– Fumar sabe bem. Se não ninguém fumava. Os fumadores, mesmo que se sintam bem, devem perceber as consequências a prazo e aquilo que têm a ganhar em qualidade de vida com o deixarem de fumar. Uma pessoa pode sentir-se bem, mas se perceber que pode desenvolver a prazo uma bronquite crónica se calhar já não se sente tão bem. Acredito que a motivação é essencial para alguém deixar de fumar.
– Quais são as principais preocupações nesta área?
– Em primeiro lugar, há muitos especialistas com mais de 45 anos e poucos com menos do que essa idade. A prazo, vamos ter um problema de falta de especialistas nesta área.
– De quem é a responsabilidade por esse futuro problema?
– Falta de planeamento ao nível da formação e de recursos. Há excesso de recursos nalguns lados e falta noutros. A racionalização dos meios compete às autoridades políticas.
– Duas sugestões para melhorar o estado das coisas.
– Em primeiro lugar, melhor articulação entre os cuidados primários e os cuidados especializados. Depois, maior investimento nos cuidados de apoio ou rectaguarda. Por que havemos de ter camas de cuidados intensivos nos hospitais ocupadas por doentes crónicos em fase terminal, quando estes só precisam de cuidados paliativos e de enfermagem?

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